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terça-feira, 23 de maio de 2023

Em Cubatão: A ÚLTIMA MORADA DAS POLACAS

 Por..:: Vicente Vilardaga*

Desde muito jovem, Fernanda Padilha, de 34 anos, tomou para si a tarefa de desvendar um mistério em sua família. Ela queria saber mais sobre a origem dos bisavós, Annie Symberlist e Henrique Luís Sims, pais de sua avó paterna, Rachelle Sims Padilha. Para tanto, vasculhou cartórios, fez contatos com supostos parentes ao redor do mundo e até recorreu à ajuda de um sistema de busca da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, o FamilySearch, que tem uma imensa base de dados genealógicos. Como informação certa, Padilha tinha apenas uma, transmitida por seu pai quando ela era criança em Santos, cidade onde nasceu: os bisavós paternos estavam enterrados em Cubatão. Curiosamente, em um cemitério destinado a prostitutas de origem judaica.

Ao pé da Serra do Mar, Cubatão é o único município desprovido de litoral na região chamada Baixada Santista. Devido a isso, nunca foi uma cidade atrativa para o turismo, mas interessou muito à indústria, por sua localização estratégica, entre o Porto de Santos e a capital paulista, a cerca de 59 km de distância. A partir de 1955, com a inauguração da Refinaria Presidente Bernardes, que já foi responsável pela produção de 50% dos petroquímicos nacionais (hoje é 8%), o município se tornou um indispensável polo industrial para o pretendido salto desenvolvimentista do país. Junto com as fábricas e refinarias, veio a poluição, numa escala tão alta que, na década de 1980, a cidade foi considerada pela onu como a mais poluída do mundo – problema que ainda se tenta amenizar.

Nas primeiras décadas do século XX, Cubatão não poderia supor esse futuro. Era uma localidade amena e discreta, parte da cidade de Santos, e foi lá que prostitutas, cafetinas e cafetões de origem judaica que atuavam na zona portuária decidiram criar sua última morada. Reunidos na Associação Beneficente e Religiosa Israelita, eles conseguiram em 1929 que a Câmara Municipal de Santos cedesse um terreno em Cubatão para o cemitério, que se manteve no local até 1952, quando a área foi ocupada pela Refinaria Presidente Bernardes. Todos os restos mortais foram, então, transladados para o cemitério atual, onde antes havia um sítio, o Cafezal, como descreve a professora Evania Martins Alves, autora da monografia O Cemitério Israelita em Cubatão – Um Capítulo da História dos Judeus na Baixada Santista, seu trabalho de conclusão do curso de história da UniSantos. No estudo, Alves esclarece que a associação formada pelas prostitutas buscava garantir serviços religiosos e enterro a seus associados, impedidos de serem sepultados nos cemitérios tradicionais da comunidade judaica. 

A luta por um cemitério não foi exclusividade das prostitutas de Santos: fez sempre parte dos objetivos das associações criadas por trabalhadoras do sexo judaicas nas Américas, seja no Rio de Janeiro ou em São Paulo, seja em Nova York ou em Buenos Aires. “O mais bacana dessa história é como elas deram uma virada na vida e construíram sociedades de ajuda mútua para se manter judias”, diz a historiadora Beatriz Kushnir, autora de Baile de Máscaras – Mulheres Judias e Prostituição – As Polacas e Suas Associações de Ajuda Mútua. “Polacas” foi como ficaram vulgarmente conhecidas as mulheres de origem judaica vindas do Leste Europeu e que no Brasil trabalhavam como prostitutas. 

A versão corrente diz que muitas dessas mulheres foram forçadas à prostituição por organizações criminosas judaicas, especialmente pela Zwi Migdal, que atuou até a década de 1930. Mas os estudos de Kushnir indicaram que nem todas as mulheres eram escravas brancas, pois muitas não foram traficadas e já se prostituíam na Europa. Além disso, algumas eram cafetinas, donas do negócio. Para a historiadora, as associações criadas por essas mulheres eram uma tentativa de manter vínculos culturais e espirituais, e provam que havia entre elas uma experiência de sociabilidade que ia muito além do negócio do meretrício e que envolvia afetos, relações familiares e religiosidade.

Em seu livro, Kushnir analisa principalmente as associações ou sociedades beneficentes que criaram o Cemitério Israelita de Inhaúma (conhecido como “Cemitério das Polacas”), fundado em 1916, na Zona Norte do Rio de Janeiro, e um determinado setor do Cemitério Santana (conhecido como “Cemitério Chora Menino”), criado em 1897 pela prefeitura no bairro de Santana, em São Paulo. Nos anos 1970, o setor judaico desse cemitério foi objeto de uma decisão escandalosa: a prefeitura resolveu desapropriá-lo e incorporar a área ao Cemitério de Santana em geral. Isso levou ao posterior traslado dos restos mortais das “polacas” para o Cemitério Israelita do Butantã, porém sem que os nomes delas fossem colocados nas lápides, nas quais se registraram apenas números. Mais tarde, nos anos 2000, devido a pressões da comunidade judaica, os nomes foram estampados nas lápides, com base em uma lista de sepultamentos descoberta no arquivo municipal.

Ao pesquisar sobre a necrópole de Cubatão, Kushnir encontrou a ata de uma Assembleia Geral Extraordinária da associação judaica formada em Santos, datada de 3 de dezembro de 1966. O ano é o mesmo do último sepultamento registrado no cemitério cubatense. Na ata, consta que os membros haviam decidido vender o imóvel da associação – na Rua Amador Bueno, 322, no Centro de Santos (hoje ocupado por uma marmoraria) –, “em virtude de a receita da sociedade estar bastante reduzida, por motivos e causas várias, notadamente pelo falecimento e mudança de domicílio de sócias”. Segundo Kushnir, por volta dos anos 1960, as sócias viviam o fim da associação em Santos, com a morte de seus membros e a impossibilidade de equilibrar receitas e despesas.

Desde 2010, o cemitério judaico faz parte do patrimônio histórico de Cubatão. Foi tombado pela prefeitura e encampado como patrimônio cultural pela Chevra Kadisha – Associação Cemitério Israelita de São Paulo, sociedade dedicada a executar a preparação dos corpos dos mortos de acordo com as leis judaicas. A entidade administra três cemitérios na Região Metropolitana de São Paulo – o da Vila Mariana (criado em 1919), o do Butantã (inaugurado em 1953) e o de Embu das Artes (fundado em 2001) – e o de Cubatão. As quatro necrópoles reúnem mais de 35 mil sepulturas.

A Chevra Kadisha faz a gestão compartilhada do cemitério de Cubatão com a prefeitura da cidade. A associação judaica zela pelas construções, enquanto a administração municipal cuida da limpeza e da jardinagem. Há 68 túmulos ali, seis deles sem identificação, com homens e mulheres enterrados em áreas separadas. Fernanda Padilha é a única pessoa conhecida cujos antepassados foram sepultados no local. Mas não é certo que seus bisavós eram judeus. 

Diretor da Chevra Kadisha, o historiador Guilherme Faiguenboim, de 76 anos, só soube da existência do cemitério de Cubatão três décadas atrás. “Lembro que os pais falavam baixinho sobre o assunto das polacas, o pessoal se envergonhava desse passado, não queria que os outros soubessem, mas comecei a escutar e quis saber mais”, diz Faiguenboim, que dedicou à necrópole da Baixada Santista algumas páginas de seu livro Os Primeiros Judeus de São Paulo – Uma Breve História Contada Através do Cemitério Israelita de Vila Mariana, escrito com Paulo Valadares e Niels Andreas.

Sua primeira visita ao local foi em meados dos anos 1990, depois da publicação do estudo de Kushnir e de notícias na imprensa sobre a existência do cemitério. “Após o último sepultamento, caiu em esquecimento”, conta. Faiguenboim lembra que teve dificuldade para achar o lugar. Deparou com um espaço em ruínas, depredado, com lápides rachadas e tomado pelo mato.

Em 1997, foi entregue a primeira reforma do cemitério, feita durante a gestão do então prefeito de Cubatão Nei Eduardo Serra, com o apoio da Chevra Kadisha, então presidida por Marcos Zlotnik. Diante das dificuldades de manutenção constante, Faiguenboim propôs ao prefeito a transferência dos túmulos para o cemitério judaico de Embu das Artes. “Eles acharam que era melhor não transferir, pois o lugar deveria ser uma atração. Resolvemos reformar”, diz. “Não sei dizer o grau de perda da dimensão religiosa, mas é fato que virou algo diferente.” Uma nova reforma foi feita mais de dez anos depois da primeira.

Em seu livro, Faiguenboim lista os que foram sepultados ali, identificando 62 pessoas, sendo 49 mulheres e 13 homens, inclusive Annie Symberlist e Henrique Luis Sims, os bisavós de Fernanda Padilha. O historiador também transcreve as inscrições nas lápides. Supõe-se que os homens que estão no cemitério tenham sido cafetões ou maridos das cafetinas. “Elas eram discriminadas pelos judeus tradicionais, que tinham vergonha delas e dos cafetões, pois eram considerados impuros. Por isso tinham cemitério e sinagoga à parte. O único momento em que se misturavam aos demais judeus era nas apresentações de alguma companhia de teatro ídiche”, explica o historiador. Mas ele acredita que essa questão está hoje mais “pacificada” na comunidade judaica, principalmente nas novas gerações, e diminuiu o nível de tensão em relação a uma memória inconveniente. “Os judeus pediram perdão àquelas mulheres e aos seus descendentes pela discriminação que sofreram”, diz. “Há um esforço maior para entender o que acontecia naquele momento do passado.”

O Cemitério Israelita de Cubatão ocupa uma área de 853 m2, cercada por muros dentro do Cemitério Municipal de Cubatão, na Rua José Vicente, sem número. Para alcançar o local, é preciso atravessar longos corredores de túmulos desprovidos de vegetação. Quando se chega lá, a sensação é a de estar em um jardim, com uma bonita vista para o paredão da Serra do Mar e a Usina Hidrelétrica Henry Borden. Uma jaqueira de galhos amplos fornece sombra para uma dezena de lápides. É um local isolado e melancólico, que convida à reflexão sobre a finitude e o desaparecimento.

As mulheres estão todas enterradas na ala à esquerda do portão de entrada, com os túmulos organizados em seis fileiras. Os homens foram sepultados do lado direito. O primeiro túmulo em geral é o de Regina Finkelstein, falecida em 1924. Entre os homens, o primeiro é o de Wolf Schaverman, que morreu em 1927, como consta em sua lápide, onde também se lê a seguinte mensagem: “Saudade da Sociedade Beneficente Israelita de Santos.”. Pesquisas indicaram que os restos mortais de Finkelstein, Schaverman e de Anna Wilka, que morreram antes da criação da necrópole, estavam originalmente no Cemitério de Paquetá, em Santos, e foram trasladados para o de Cubatão em 1929, quando o local foi inaugurado, assim como a associação.

O túmulo mais recente é o de Haklia Brasnopolshy, falecida em junho de 1966. A maioria das sepulturas é de construção simples, de cimento e pedra, mas há também as sofisticadas, de granito ou mármore, com inscrições em iídiche ou português. Algumas lápides trazem a foto das sepultadas, mas poucas imagens estão em bom estado. A maior parte delas está desbotada ou quebrada.

O túmulo de Henrique Luís Sims (1884-1953) é bem modesto, mas o de sua mulher, Annie Symberlist, tem uma bela lápide de granito, o que indica que a família talvez tivesse mais recursos financeiros quando ela morreu do que na época do falecimento dele, ou que ela exercesse uma função proeminente na associação. Na lápide de Symberlist aparece o apelido Anita entre parênteses, a data de nascimento (15/08/1892) e a de morte (02/12/1964), além da declaração “Saudades de sua filha, genro e netos.” Pode não ser mera coincidência que a associação tenha fechado as portas um ano depois da morte dela.

Nos epitáfios de Cubatão, nota-se em geral a vontade de afirmar uma boa reputação e a existência de relações familiares, com várias mensagens fazendo referência aos filhos, assim como a vínculos com a própria associação beneficente. No túmulo de Liba de Queiroz, morta em 1948, aos 70 anos, a fotografia na lápide está bem visível e sobre a campa está escrito, em iídiche, que ela foi uma “mulher importante e honrada, filha de Aizik Greimer, nasceu em Odessa e morreu com bom nome”. Sua memória é saudada por “esposo, irmã e sobrinhos”.

O portão de acesso ao cemitério está sempre trancado. E quem tem a chave é o funcionário Welington Borges, que programa as visitas e é responsável pela gestão do espaço. Formado em história e técnico administrativo dedicado ao turismo, ele era presidente do Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Cubatão quando o cemitério foi tombado. Na sequência, assumiu a recém-criada Secretaria de Cultura e começou a promover o local e fazer visitas guiadas. Ele diz que essas visitas, que não são muito frequentes, aumentaram um pouco desde a terceira reforma, feita em 2019. A prefeitura tem feito a parte dela, cuidando da limpeza, e mantém contato com a Chevra Kadisha para que sejam executados os serviços de manutenção e restauro.

Entre os frequentadores mais assíduos do cemitério está o guia e professor de história Felipe Lichand Paulino, de 27 anos, judeu que vive no bairro paulistano do Bom Retiro e cujos avós vieram da Polônia. Colaborador do canal argentino Turismo Judaico, no YouTube, onde destaca locais que podem ser atrativos aos viajantes judeus, Paulino dedicou um de seus programas à Baixada Santista. Ele mostrou os destinos mais tradicionais na região, como as duas sinagogas de Santos, a Beit Jacob e a Beit Sion, e também apresentou o Cemitério Israelita de Cubatão, despertando a curiosidade de algumas pessoas.

O público-alvo de seus roteiros turísticos são os viajantes judeus estrangeiros que descem de navios de cruzeiro e passam o dia em Santos. Mas o assunto também desperta a atenção de moradores de São Paulo que querem saber mais da história da comunidade judaica na Baixada Santista. Aos turistas que leva ao cemitério, Paulino costuma explicar que as pessoas enterradas ali eram imigrantes do Leste Europeu, vieram para o Brasil na virada do século xix para o xx, fugindo da extrema pobreza em seus países, e por isso mesmo foram impelidas a trabalhar na prostituição, às vezes aliciadas por máfias que atuavam na Europa. Ele sempre ressalta que muitas dessas mulheres souberam dar a volta por cima, reagindo às pressões sociais. “A identidade delas era tão forte que, mesmo excluídas, lutaram para fazer seu próprio cemitério. O poder simbólico disso é muito grande”, diz Paulino, que só se inteirou sobre a história das polacas alguns anos atrás. “A comunidade judaica não fala disso, e algumas historiadoras, por questões de gênero, passaram a se dedicar ao assunto.”

Entre os presentes na reabertura do cemitério, em julho de 2019, estavam o presidente da Chevra Kadisha, Mauro Zaitz, o rabino Shie Pasternak e o historiador Nachman Falbel, professor titular da usp, que dedicou um capítulo de seu livro Judeus no Brasil – Estudos e Notas às polacas. O historiador Guilherme Faiguenboim também estava no local. Na ocasião, Falbel esclareceu que a situação de extrema miséria dos imigrantes do Leste Europeu foi um fator decisivo para tornar as mulheres vítimas de tráfico e levá-las à prostituição no Brasil. O rabino, em nome da comunidade israelita, pediu perdão às prostitutas e destacou “que só tem futuro quem reconhece os erros do passado”.

A responsável pela última reforma foi a restauradora Maria Salete Otama Onady, de 72 anos, que também cuidou da manutenção do Cemitério Israelita da Vila Mariana, criado entre os anos 1920 e 1930. Ela é viúva do primeiro restaurador da necrópole de Cubatão, Stefan Onady, técnico húngaro que durante cinquenta anos atuou na manutenção do Cemitério Israelita do Butantã. Maria Salete não é de origem judaica, e seu marido tampouco era. “Quando ele pegou a tarefa de recuperação nos anos 1990, o cemitério de Cubatão estava totalmente abandonado, tinha plantação de mandioca lá dentro, galinheiro, 90% das sepulturas estavam violadas. Conseguiu deixar os túmulos bonitinhos e recuperar todos os letreiros”, diz ela, que está aposentada, mas ainda presta serviços para a Chevra Kadisha.

Maria Salete conta que a ideia de restaurar o cemitério de Cubatão surgiu depois de jornais apontarem o estado de abandono em que se encontrava. “Na ocasião, a Chevra Kadisha assumiu totalmente a responsabilidade pela recuperação porque a Sociedade Israelita de Santos não quis colaborar.” Os cuidados com o local precisam ser frequentes. “O problema é que, em razão das chuvas, da maresia e do calor sufocante de Cubatão, as inscrições somem muito rápido.” A restauradora diz que a Chevra Kadisha a procurou para uma nova reforma, a quarta, o que ela está ansiosa para fazer. “Os letreiros em hebraico, só eu sei fazer, e é a coisa que toma mais tempo. Às vezes, numa lápide, só resta uma perninha da letra, e eu consigo descobrir qual é.”

Em 2019, quando soube que haveria um evento de reinauguração do Cemitério Israelita de Cubatão, Fernanda Padilha resolveu comparecer e conferir os túmulos de seus bisavôs: Henrique Luís Sims, morto aos 69 anos de idade, e Annie Symberlist, aos 72 anos. “Foi uma cerimônia muito bonita com fotos e discursos comoventes. Conversei com muita gente, e todos se surpreendiam com o fato de existir uma parente direta de pessoas enterradas ali”, recorda Padilha. Ela se emocionou ao ver o túmulo modesto do bisavô, mas com a seguinte inscrição: “Saudades de sua esposa e filha”. E notou a placa dourada reluzente na lápide de granito da bisavó.

Padilha é formada em informática pela Universidade Paulista (Unip) e atualmente vive com o marido em Lisboa, onde trabalha como vendedora de uma loja de roupas. Em sua busca da origem familiar, ela descobriu que, em 10 de março de 1927, a bisavó deixou o porto de Southampton, na Inglaterra, no navio Orania, com destino ao Rio de Janeiro. A vendedora recuperou também um documento de uma viagem do bisavô de Buenos Aires para o Rio, no navio Almanzora, em julho de 1927. Há uma possível coincidência nos bilhetes de viagem de Henrique e Annie: o endereço residencial que aparece é o mesmo, a Casimir Road, nº 13, em Londres. Mas isso não pode ser confirmado porque o bilhete está cortado ao meio. Padilha, porém, está convencida de que os dois se conheciam antes de chegar ao Brasil e moraram na mesma casa na capital inglesa.

Pelo Family Search, ela pode verificar que os dois se casaram na Inglaterra. Annie Dorer (o nome de solteira da bisavó) contraiu matrimônio no dia 11 de abril de 1916, em Londres, com Louis Symberlist, cujo sobrenome ela adotou. No resumo de vida que aparece no sistema de busca dos mórmons, consta que ele nasceu em Londres e era filho de Abraham Symberlist e Dorah Cymbelst. Entretanto, ao vir para o Brasil, Louis Symberlist adotou o nome Henrique Luís Sims. A primeira referência a esse novo nome até agora encontrada está no bilhete da viagem de Buenos Aires. O mesmo nome aparece em todos os documentos posteriores.

 No Brasil, é provável que os bisavós de Padilha tenham vivido em São Paulo, pois a filha deles, Rachelle Sims, foi registrada nessa cidade, em 1929, como consta na certidão de nascimento. Embora tenha chegado ao Rio em 1927, a bisavó só recebeu autorização de residência de estrangeiro em 1940, em Santos, mas sem qualquer número de identificação, o que indica alguma precariedade em sua situação legal de imigrante. No atestado de óbito, o número da carteira de identidade consta como “ignorado”.

Sobre a nacionalidade dos bisavós, os documentos encontrados por ela no Brasil divergem. Ora eles aparecem registrados como ingleses, ora como russos ou poloneses. Embora ainda não haja provas, Padilha suspeita que os dois sejam judeus. Ou, ao menos, a bisavó, pois o seu registro de óbito diz que ela nasceu em Varsóvia, na Polônia. No mesmo documento, aparecem os nomes dos pais dela, Moyses Darer e Rachel Darer. Padilha foi atrás de informações sobre os Darer e verificou que o nome correto era Dorer. Ela atribui a diferença a um erro de grafia no Brasil. O trisavô materno ela já sabe que está sepultado em Varsóvia, fez contato com o cemitério e obteve uma foto da lápide. Com a ajuda de primas distantes, descendentes da irmã de Henrique Luis, Norah, também tenta encontrar documentos do censo de Londres para avançar mais na sua pesquisa.

Padilha acredita que o sobrenome Sims, adotado pelo bisavô, seja inventado. Segundo algumas fontes, o sobrenome era usado na Escócia, na Idade Média, sendo provavelmente uma abreviação dos nomes bíblicos Simon ou Simeão. Mas certamente Sims não é um sobrenome judeu nem consta na árvore genealógica de Henrique Luis. O sobrenome Symberlist aparece, segundo ela, com algumas variações na Inglaterra e nos Estados Unidos. Até agora não foi possível explicar os motivos que levaram o avô a mudar a identidade na travessia do Atlântico, mas pode ter sido por causa de atividades associadas à prostituição. Ao manter o sobrenome Symberlist com Annie, que o adquiriu no casamento, Henrique Luis mostrou, porém, que não quis esconder suas origens completamente, deixando pistas para a posteridade.

A bisneta soube que a Inglaterra era uma escala regular para prostitutas e cafetões que vinham do Leste Europeu em direção à América do Sul, principalmente para Buenos Aires, e aos Estados Unidos. O mais sugestivo no levantamento que ela fez, porém, é que o endereço do bisavô na ocasião de sua morte, em 1953 – na Rua Amador Bueno, em Santos – coincide com o da associação beneficente, tal como registrado na última ata, de 1966, que recomenda a venda do imóvel. Não foi descoberto qualquer documento que vincule o nome de Annie ou o de Henrique Luís à associação, mas a coincidência de endereço sugere que eles tiveram algum protagonismo na sociedade.

Padilha tem uma hipótese a respeito disso: os seus bisavós teriam exercido uma posição de poder na estrutura da associação e possivelmente no próprio prostíbulo, tendo em vista a herança que deixaram, que ajudou até agora no sustento de três gerações. As associações, sociedades legalmente constituídas e onde se prestavam serviços religiosos, e os prostíbulos não ocupavam o mesmo endereço. “Meu pai e meu tio negam a história da prostituição, parece que eles têm vergonha do que aconteceu”, afirma Padilha. “Na versão familiar, meus bisavós vieram com dinheiro da Europa. Não tem discussão.” Ninguém na família de Padilha quis acompanhá-la nas pesquisas sobre o passado dos bisavós, mas também não houve qualquer crítica à sua pesquisa.

Quando Rachelle, a filha de Annie e Henrique, nasceu, ela tinha 37 anos e ele, 45, idades relativamente avançadas na época. A avó nunca reclamou de problemas na infância, o que leva Padilha a crer que seus bisavós formaram um casal estável e sem problemas financeiros, mesmo que tenham vivido do meretrício. Ela também conta que seu pai se recorda de ter participado de atividades religiosas judaicas quando era muito pequeno – o que indica que sua avó talvez seguisse o judaísmo, antes de se tornar mórmon.

Na reinauguração do Cemitério Israelita de Cubatão, Padilha teve a oportunidade de conversar com pesquisadores, como a antropóloga Paula Janovitch, que estuda a cultura e a história de São Paulo, inclusive assuntos relacionados à prostituição e aos direitos das mulheres. A antropóloga conta que, nos trinta anos em que se debruça sobre esses temas, deparou com várias pessoas que se diziam descendentes dessas mulheres, mas nunca conseguiram provar, algo que Padilha conseguiu. “Fernanda avançou bastante em sua pesquisa sobre as origens familiares e teve condições de achar documentos reais que em poucas situações podem ser achados. Em busca do passado dela, conseguiu chegar num lugar incrível”, diz Janovitch. Sobre o passado judeu, entretanto, as lacunas são muito grandes para Padilha resolver. “Os documentos não conseguem comprovar o judaísmo dos bisavós. Eles não se declaram ou são declarados judeus em nenhum momento e todos os nomes a gente têm que relativizar. Não consigo ver qualquer pista que vá nessa direção.”

Para Padilha, que seguiu a religião da avó e se tornou mórmon, descobrir o caminho que seus bisavós trilharam é um objetivo fundamental de vida. Logo após visitar o cemitério, ela e o marido venderam tudo que tinham e se mudaram para a Europa. “Minha meta é recuperar o sentido da viagem dos meus ancestrais”, diz ela, que ainda planeja uma viagem à Polônia, onde acredita que estão suas raízes familiares. “Estou esperando uma folga do trabalho para ir até lá. Mas já estou satisfeita só de saber alguns dos lugares por onde eles andaram e algo do que realizaram. Isso me deu muito orgulho. Que luta, que escolhas eles fizeram, não?”  

Vicente Vilardaga*: É jornalista e escritor. Publicou os livros À Queima-roupa – O caso Pimenta Neves (Leya) e A Clínica – A farsa e os crimes de Roger Abdelmassih (Record).

Fonte..:: Piauí


terça-feira, 14 de março de 2023

Formigas se comportam diferente no Cerrado e na Mata Atlântica

 Texto: André Julião | Agência FAPESP

Um grupo de pesquisadores brasileiros se aprofundou na história natural das formigas carpinteiras Camponotus renggeri e Camponotus rufipes e constatou que, ainda que algumas espécies sejam as mesmas em diferentes lugares, elas podem ter comportamentos distintos como resposta ao ambiente.

Foto..:: Miguel Pereira Romeiro


Os resultados do estudo, apoiado pela FAPESP por meio de três projetos (17/18291-2, 19/12646-9 e 20/15636-1), foram publicados na revista Insectes Sociaux por cientistas das universidades estaduais Paulista (Unesp) e de Campinas (Unicamp).

“Não sabemos ainda se as populações têm uma plasticidade que as permite viver em diferentes ambientes ou se são linhagens genéticas adaptadas a determinadas condições. Com esse trabalho, fundamentalmente feito no campo, abrimos espaço para uma série de perguntas”, conta Gustavo Maruyama Mori, professor do Instituto de Biociências (IB-CLP) da Unesp em São Vicente e coordenador do projeto.

Os pesquisadores passaram dias observando o comportamento de formigas das duas espécies no Parque Estadual Xixová-Japuí, entre os municípios de São Vicente e Praia Grande, no litoral sul paulista. Depois de localizar os formigueiros, eles registravam o horário de saída dos insetos, a distância percorrida e o que levavam para o ninho, entre outras informações.

Parte do grupo já havia feito estudos no Cerrado que determinaram muito do que se sabe sobre essas espécies, mas era preciso descobrir se os comportamentos eram os mesmos em outros ecossistemas, como a Mata Atlântica.

“Vimos, por exemplo, que no Cerrado C. renggeri predominantemente faz ninhos em troncos de árvore apodrecidos e C. rufipes também usa bastante palha seca. Agora, observamos que no litoral ambas fazem ninhos apenas em palha seca, por vezes acrescentando folhas verdes ou secas”, exemplifica Miguel Pereira Romeiro, estudante de graduação no IB-CLP-Unesp.

Romeiro divide a primeira autoria do artigo com outro graduando na mesma instituição, Gabriel Vanin.

Um comportamento que se repetiu tanto no Cerrado quanto na Mata Atlântica foi a separação espacial das espécies. Onde uma se estabelece, a outra normalmente fica de fora.

Durante o estudo de campo na Mata Atlântica, os pesquisadores presenciaram até uma luta entre as diferentes formigas quando estas se cruzaram, inclusive com a decapitação de uma C. rufipes.

“Junto com a separação espacial, essa é uma evidência de uma possível competição entre as espécies, que, apesar de não serem encontradas juntas, compartilham áreas de alimentação”, diz Marianne Azevedo Silva, que conduziu a pesquisa durante seu doutorado no Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, sob orientação do professor Paulo Sérgio Oliveira.

..:: Recursos

Uma das diferenças observadas se dá na distância que as formigas percorrem para adquirir alimento em cada bioma. Os pesquisadores encontraram áreas de forrageamento, como são chamadas, menores na Mata Atlântica do que no Cerrado.

“Essa evidência sugere que a Mata Atlântica forneça mais recursos do que o Cerrado para essas espécies e, portanto, as formigas não precisam ir tão longe para adquirir alimento”, explica Vanin.

Uma vez que a vegetação do Cerrado é mais rasteira e as árvores mais esparsas, as formigas precisariam ir mais longe para obter a mesma quantidade de néctar, insetos mortos ou mesmo encontrar afídios, mais conhecidos como pulgões.

Esses insetos, que se alimentam de plantas, fornecem uma substância açucarada que representa um importante recurso alimentar para as formigas – e com essa estratégia os pulgões escapam da predação. Na Mata Atlântica, a vegetação mais densa permitiria obter alimentos com mais facilidade.

Em dezembro, parte do grupo se reuniu num workshop e visitou o Parque Nacional do Itatiaia, na divisa entre Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo. Com vistas incríveis e uma rica biodiversidade para se maravilhar, até mesmo os olhos treinados dos pesquisadores se surpreenderam ao encontrar, numa altitude de 2 mil metros, as mesmas formigas observadas no litoral paulista e no Cerrado.

“Ainda que estejamos realizando outros trabalhos atualmente, não paramos de falar delas. Nos perguntamos qual será o próximo local improvável em que as encontraremos”, encerra Romeiro.

O artigo Natural history of Camponotus renggeri and Camponotus rufipes (Hymenoptera: Formicidae) in an Atlantic Forest reserve, Brazil pode ser lido em: https://link.springer.com/article/10.1007/s00040-022-00880-6.

Fonte..:: Gizmodo

quinta-feira, 2 de setembro de 2021

Ilha Porchat em São Vicente SP tem o formato geográfico do Mapa do Brasil

 


Você Sabia que a Ilha Porchat tem a forma geográfica de nosso País?

A Ilha Porchat desde não é, de fato uma ilha, mas um promonotório (uma elevação), pois está ligada à ilha de São Vicente por uma ponte, construída para facilitar o acesso, quando no passado a maré subia. Existem muitas histórias sobre a Ilha Porchat e seus diversos proprietários ao longo dos anos. Em meados de 1800 teria sido vendida à renomada família Porchat, que lhe deu o sobrenome como é conhecida hoje.

Para Roteiros de Turismo em São Vicente e Região


terça-feira, 17 de agosto de 2021

Foto Antiga São Vicente SP: Lançamento do empreendimento Belvedere Mar Pequeno no Bairro do Japuí, nos anos 1960



Lançamento do empreendimento Belvedere Mar Pequeno no Bairro do Japuí, nos anos 1960.

O Loteamento foi realizado na Propriedade de Luiz Antônio Barreiros, bananicultor e ex-presidente da Associação Comercial, Agrícola e Industrial de São Vicente.

Atrás da placa de lançamento vê-se ainda parte do bananal cuja produção era exportada para o Uruguai e Argentina.

Acervo Familiar: Lilian de Santana Botelho, Via São Vicente na Memória. 


Para Roteiros de Turismo em São Vicente e Região

WWW.R9TURISMO.COM



sexta-feira, 9 de julho de 2021

domingo, 4 de julho de 2021

domingo, 17 de janeiro de 2021

Moradores podem registrar orgulho por São Vicente em fotos e vídeos.


Regulamento AQUI do concurso: Desenhe São Vicente.


História Igreja Matriz de São Vicente Mártir

A Primeira Paróquia do Brasil, pelo Alvará Régio de 1535, a primeira igreja foi construída por Martim Afonso de Souza, próximo à praia onde aconteceu a fundação oficial da Vila de São Vicente, tendo como primeiro Pároco o Padre Gonçalo Monteiro. Esta foi destruída devido a um maremoto que aconteceu em 1542. A segunda foi erguida pelo povo e a Câmara em 1559, afastada da praia, mas, segundo alguns historiadores, foi destruída pelo ataque de piratas. A atual Matriz foi erguida no local da segunda construção, na Praça João Pessoa.

Foto de Renato Marchesini

Curiosidades:

Na Igreja Matriz estão sepultados inúmeros personagens da cidade, o que a torna autentica Panteão.

Denomina-se Igreja Matriz de São Vicente, em homenagem a Vicente, diácono que foi submetido a cruéis torturas, das quais veio a falecer em 22.01.304 (data da fundação da cidade 22/01/1532).


Para Roteiros de Turismo em São Vicente e Região


quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

A VILA DE SÃO VICENTE: Índios, Piratas e o Mar

Embora em franco desenvolvimento, com a lavoura de cana-de-açúcar crescendo a olhos vistos, a Vila de São Vicente também enfrentava outros problemas além da constante ameaça dos índios. A primeira ocorrência grave se deu quando o espanhol Ruy Moschera, morador de Iguape, atacou a Vila, saqueando o porto e os armazéns e carregando tudo o que ele e seus homens podiam. Antes disso, derrotou em batalha o Padre Gonçalo Monteiro, vigário e homem de confiança de Martim Afonso de Sousa.

Em 1542, ocorreu o pior desastre natural em São Vicente. O mar agitado avançou demais, engoliu a praia a entrou pelas pequenas ruas, destruindo a Igreja Matriz, a Casa do Conselho, a Cadeia, os estaleiros, o pelourinho e inúmeras casas. A Vila teve que ser reconstruída um pouco mais distante do mar.

Mas nem tudo estava resolvido. Por volta de 1560, São Vicente sofreu um maciço ataque dos índios tamoios. Eles se aproveitaram da ausência dos homens, que haviam sido chamados em uma missão de socorro no Rio de Janeiro, e queimaram as plantações, quebraram as ferramentas e utensílios agrícolas e destruíram as fazendas.

Em dezembro de 1591, a São Vicente foi saqueada pelo pirata inglês Thomas Cavendish, que retornava de um ataque a Santos. Ele e seus homens roubaram e atearam fogo em diversas partes da Vila, causando enormes prejuízos. O pirata fugiu, mas um temporal o impediu de seguir viagem Ele retornou e tentou uma nova investida. Porém, desta vez a população das duas vilas estava preparada e Cavendish foi repelido.

Em 1615, outro pirata atacou São Vicente. O holandês Joris Van Spilbergen dividiu seus homens e, enquanto um grupo saqueava a Vila para obter alimentos, o restante dos homens invadia a vila vizinha. Os piratas ocuparam o engenho e entraram em luta com os moradores locais. Os invasores foram expulsos e a vida aos poucos voltou ao normal.

Com o passar do tempo, os problemas que surgiram eram de outra natureza, principalmente econômica, em virtude do crescimento da região e de São Paulo. A tenacidade de sua gente e a mística de ter sido a Primeira Cidade do Brasil fizeram com que São Vicente enfrentasse os séculos com altivez, mantendo lugar de destaque no contexto do Estado e da Nação.



segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

COMPANHIA DE JESUS EM SÃO VICENTE

Aprovada pelo Papa Paulo III em 1540, a Companhia de Jesus era formada por poucos, mas ardorosos membros, preocupados em revigorar a fé católica. Os primeiros jesuítas chegaram ao Brasil em 1549, junto com Tomé de Sousa, liderados pelo Padre Manoel da Nóbrega. Eram pobres e pouco recebiam da Companhia para sobreviver. Comiam com os criados de governantes e contavam, mensalmente, com um cruzado em ferro para sua manutenção. Essa quantia era aplicada por eles no ensino dos meninos indígenas. Foi em São Vicente que o Padre Leonardo Nunes construiu, em 1549, a primeira escola-seminário para os meninos brancos e índios que, ampliada em 1553, tornou-se o 2.º Colégio dos Jesuítas do Brasil.


Eles estavam sempre mais suscetíveis às doenças, pois eram mal alimentados, mal abrigados, viviam sem higiene e andavam pelo meio das matas e rios para ir de uma aldeia à outra. A situação era tão precária que, em 1552, o próprio Padre Manoel da Nóbrega ainda vestia a única roupa que havia trazido consigo três anos antes.

É certo que o trabalho missionário produziu bons frutos na Vila de São Vicente e também na Vila de São Paulo de Piratininga, principalmente porque os religiosos percorriam as aldeias distribuindo presentes, socorrendo enfermos e ensinando músicas e brincadeiras às crianças. Porém, a interferência dos missionários em relação ao trabalho escravo indígena começou a gerar problemas para os jesuítas.

Isso porque, cada vez mais, os colonos tratavam os índios com exagerada brutalidade, contrariando a Bula do Papa Paulo III, segundo a qual era vontade do Espírito Santo que se reconhecesse os índios americanos como verdadeiros homens.

A situação se agravou quando os padres procuraram influir nas autoridades locais. Além disso, receberam grandes propriedades por meio de doações dos donatários e, desafiando os colonos, decidiram passar a administração das terras para os índios. Em certo tempo, oficiais da Câmara de Vereadores chegaram até a expulsar os missionários da Capitania.

Nesse período, os índios também começaram a se rebelar contra o trabalho escravo e passaram a atacar as lavouras agrícolas espalhadas pela Vila de São Vicente. As tribos invadiam as terras, destruíam a plantação, quebravam as ferramentas e ameaçavam os colonos. E esse foi apenas um de muitos problemas que os agricultores tiveram que enfrentar aqui.


O RELACIONAMENTO COM OS INDÍGENAS EM SÃO VICENTE SP

 


Nos tempos da fundação da Vila de São Vicente, as mais nobres famílias tupis dominavam as terras que Martim Afonso de Sousa tomaria em nome do Rei de Portugal. Os tupis eram formados por diversos grupos indígenas, em especial tamoios, carijós, tupiniquins e biobebas. O maior orgulho para a maioria das tribos era a força de seus guerreiros, tanto que eram reconhecidos pelos portugueses por suas habilidades durante as batalhas.
Naquela época, os tamoios eram maioria em São Vicente e a convivência deles com os portugueses era pacífica. Tanto que despertou a atenção da Igreja Católica, que achava que o relacionamento com os índios era uma deformação moral na conduta dos colonizadores. Isso porque os primeiros colonos logo adotaram os usos e costumes indígenas, em especial a poligamia.
De acordo com os registros, nos primeiros tempos, só vinham da Europa homens solteiros ou casados que deixavam lá suas famílias. Depois de meses no mar, mantendo contato com a simplicidade da moral indígena, eles entregavam-se ao concubinato. A situação era preocupante e surpreendeu os jesuítas recém-chegados que, além da missão de catequizar os indígenas, também trabalharam para que os portugueses recuperassem sua condição de civilidade.
Mas nem todos os índios eram temidos pela Igreja. O Cacique Tibiriçá foi um forte aliado dos jesuítas e amigo dos portugueses. Chefe de uma grande nação indígena e sogro do português João Ramalho, que vivia em São Vicente desde 1493, ele comandou o desarmamento frente à esquadra de Martim Afonso de Sousa, garantindo a chegada tranqüila do fundador à nova terra.
Conta a história que, ao saber da aproximação das naus, Tibiriçá reuniu 500 homens armados com arcos e flechas e preparados para o ataque. João Ramalho, reconhecendo que a expedição era portuguesa, intermediou as conversações entre os colonizadores e o sogro. Tibiriçá e Martim Afonso de Sousa negociaram a paz e recolheram as armas.
Pouco tempo depois, atendendo a um pedido dos jesuítas, Tibiriçá transferiu sua tribo para um local próximo ao Colégio de São Paulo, com o objetivo de garantir a segurança. O Cacique cumpriu sua promessa e deu outra prova de fidelidade e amizade aos colonizadores quando impediu, com bravura, um ataque à Vila de São Paulo de Piratininga, em 1562. Sob o seu comando, a tribo lutou e venceu os guaianás e carijós. Esse foi apenas um dos problemas enfrentados pela Igreja Católica em terras brasileiras.
Imagem: Convocação popular para um ato público, na então Vila de São Vicente, quadro de Carlos Fabra.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

AGRICULTURA e MERCANTILISMO em SÃO VICENTE no século XVI


Logo depois de chegar a São Vicente e instalar a organização administrativa que transformava o povoado em Vila, Martim Afonso de Sousa mandou demarcar terras e as distribuiu em lotes aos colonos. A posse era provisória, em alguns casos, e o donatário poderia utilizá-la apenas enquanto a cultivasse. O uso correto e a produção constante resultavam no título definitivo de propriedade.

Começou-se, então, o cultivo organizado de vários produtos, com destaque para o trigo, a vinha e a cana-de-açúcar. Para estimular o setor açucareiro, Martim Afonso de Sousa mandou erguer um pequeno engenho movido à água no centro da Vila, o primeiro engenho do Brasil. Com o sucesso desse primeiro, outros engenhos foram construídos em toda a região e, em poucos anos, São Vicente já vendia açúcar e aguardente para outras Capitanias brasileiras e até exportava os produtos para o Reino.

Com o sucesso alcançado, o passo seguinte foi a organização de uma empresa mercantil para a comercialização do excedente, já que a produção era bem superior às necessidades do consumo local. Martim Afonso de Sousa, mais uma vez, foi o pioneiro em terras brasileiras. Foi dele a iniciativa de criar uma instituição que representasse diretamente os colonos nas negociações de venda local e exportação dos produtos locais, além da intermediação da aquisição de gêneros europeus. 

O progresso da Vila era tal que muitos colonos portugueses pensaram em mandar vir as famílias que haviam deixado para trás. Foram tempos de glória, pois todo o movimento econômico da Ilha e redondezas era concentrado aqui. São Vicente abrigou o primeiro empório marítimo da costa, que se localizava onde hoje está o Porto das Naus. Também foi daqui que saíram as primeiras expedições portuguesas para o Interior, inclusive a que fundou a Vila de São Paulo de Piratininga.

A agricultura prosperava nessa fase. Os índios cultivavam a mandioca, o milho, o arroz, o algodão e várias espécies de batatas. Além disso, eles industrializavam a farinha de mandioca e produziam variado artesanato. O algodão nativo passou a ser cultivado, dando origem à indústria caseira de tecido. Nesse pormenor, as técnicas dos brancos prevaleceram sobre as nativas, embora os índios e os mestiços fossem os tecelões mais hábeis da Capitania. 

A criação de gado, cavalos, ovelhas, cabritos e galinhas também tiveram início nessa época. Trazido da Europa pelo mar até o Porto de São Vicente, o gado era levado para a Bahia e outras Capitanias do Nordeste. Na direção do Oeste, chegaram aos currais de Goiás e Mato Grosso. Em Minas Gerais, eram famosas as manadas de gado dos criadores de São Vicente. A nova atividade econômica gerou emprego aos índios que aqui viviam.


quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

SÃO VICENTE A CELLULA MATER DA NACIONALIDADE

Martim Afonso de Sousa não veio diretamente para São Vicente. Em janeiro de 1531, ele chegou a Pernambuco e, dali, mandou um mensageiro voltar a Portugal levando notícias ao Rei, enquanto seguia para o Sul. Aportou na Bahia, onde se encontrou com o famoso Caramuru. De acordo com os registros, em 30 de abril de 1531 ele chegava à Baía da Guanabara, onde mandou construir uma casa forte e instalar uma pequena ferraria para reparo das naus.

Em 1º de agosto, a expedição continuou seu caminho, chegando em 12 de agosto à Baía de Cananéia, onde o navegador português encontrou portugueses e espanhóis. Nessa viagem pela costa brasileira, durante quase um ano, Martim Afonso de Sousa enfrentou tempestades, assistiu ao naufrágio da nau capitânia e participou de um combate a navios franceses que faziam contrabando de pau-brasil.

Em 20 de janeiro de 1532, a esquadra vê surgir a Ilha de São Vicente. Porém, o mau tempo impediu a entrada dos navios na barra e a descida à terra firme só aconteceu no dia 22 de janeiro. Coincidentemente, nesse mesmo dia, 30 anos antes, a expedição do também navegador português, Gaspar Lemos, havia chegado aqui e batizado o local como São Vicente, em homenagem a São Vicente Mártir. Martim Afonso de Sousa, católico fervoroso, ratificou o nome.

Quadro: BENEDITO CALIXTO DE JESUS (1853-1927)
FUNDAÇÃO DE SÃO VICENTE Museu Paulista.

Isso porque, logo após a sua chegada, ele adotou as medidas recomendadas pelo Rei de Portugal e organizou um sistema político-administrativo nas novas terras. Assim, após batizar o local oficialmente como Vila de São Vicente, Martim Afonso de Sousa instalou aqui a Câmara, o Pelourinho, a Cadeia e a Igreja, símbolos da colonização e bases da administração portuguesa.

Para São Vicente, o título de Vila representava mais benefícios para o povo, já que esse era o termo utilizado pelos portugueses para designar uma cidade organizada. É desse fato que deriva o título vicentino de Cellula Mater da Nacionalidade, ou Primeira Cidade do Brasil. 

Pela importância estratégica do local, Martim Afonso de Sousa coordenou, em 22 de agosto de 1532, as primeiras eleições populares das Três Américas, instalando a primeira Câmara de Vereadores do continente. Por esse motivo, São Vicente é considerado como o berço da democracia americana.

O navegador português também foi o primeiro a implantar a reforma agrária no Brasil, quatro séculos antes desse tema movimentar a classe política e a sociedade. Ao mesmo tempo, plantou a semente da industrialização e do desenvolvimento agrícola que fez com que, por volta do ano de 1600, São Vicente fosse conhecido como "o celeiro" do País.



quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

INÍCIO DA POVOAÇÃO EUROPÉIA EM SÃO VICENTE SP

De acordo com os registros históricos, Antônio Rodrigues, João Ramalho e Mestre Cosme Fernandes, o "Bacharel" foram os primeiros portugueses a viver em São Vicente. 

O Bacharel de Cananéia 
(créditos Representação imaginária do Bacharel de Cananeia, por Carlos Fabra).

João Ramalho era casado com a índia Bartira, filha do poderoso Cacique Tibiriçá. Antônio Rodrigues também se casou com uma índia, filha do Cacique Piquerobi. Mestre Cosme era dono do Japuí e do Porto das Naus, onde construiu um estaleiro muito conhecido pelos navegadores da época.

A pequena povoação se organizou e começou a ser reconhecida na Europa como eficiente ponto de parada para reabastecimento e tráfico de escravos índios. Tanto isso é verdade que o porto que aqui existia já constava em um mapa feito em 1501 e trazido por Américo Vespúcio na expedição de Gaspar de Lemos, que aqui chegou em 22 de janeiro de 1502 e batizou o local como São Vicente, em homenagem a São Vicente Mártir.

Os primeiros moradores viviam em harmonia com os índios e exerciam o livre comércio com os aventureiros que para cá vinham, fornecendo-lhes farinha de mandioca, milho, carne, frutas, água e artefatos de couro, e recebendo em troca roupas, armas e ferramentas.

Tudo isso acontecia no início da década de 1520, mas alguns fatos ocorridos há alguns quilômetros daqui mudaram a vida dos primeiros moradores de São Vicente. É que em 1526, uma esquadra de seis navios comandada por Cristóvão Jaques, designada pela Coroa Portuguesa para reforçar a vigilância na costa brasileira, afundou três navios franceses perto da Bahia.

Esse fato alarmou a Corte, que decidiu iniciar a colonização oficial das novas terras conquistadas. D. João III, então, mandou que os oficiais militares preparassem uma expedição e mandou chamar seu amigo de infância, Martim Afonso de Sousa. O navegador português recebeu a missão e levou seu irmão, Pero Lopes de Sousa, além de 400 homens, que lotaram as cinco embarcações. A expedição partiu de Lisboa no dia 3 de dezembro de 1530.


terça-feira, 1 de dezembro de 2020

ORIGEM DO NOME DA CIDADE DE SÃO VICENTE SP


Tela de Benedito Calixto (final séc. XIX), pertencente à Prefeitura de São Vicente, mostra como teria sido a ancoragem da frota de Martim Afonso no Porto das Naus.

A história da origem do nome de São Vicente começou há muito tempo, no ano 325, na cidade espanhola de Huesca, uma então Província de Saragoza. Lá nasceu o jovem Vicente, padre dedicado que se destacava por seu trabalho, tanto que o bispo de Saragoza, Valério, lhe confiou a missão de pregador cristão e doutrinador catequético.
Valério e Vicente enfrentavam, naquela época, o imperador Diocleciano, que perseguia os cristãos na Espanha. Os dois acabaram sendo presos por um dos homens de confiança do imperador, Daciano, que baniu o bispo e condenou Vicente à tortura. O martírio sofrido por Vicente foi tão brutal, a ponto de surpreender os carrascos. Eles relataram a impressionante resistência do rapaz que, mesmo com gravetos de ferro entre as unhas e colocado sobre uma grelha de ferro para ser queimado aos poucos, não negou a fé cristã.

Ao final daquele dia 22 de janeiro, os carrascos decidiram matar-lhe com garfos de ferro, dilacerando-o completamente. Seu corpo foi jogado às aves de rapina. Os relatos dão conta de que uma delas, um corvo, espantava as outras aves, evitando a aproximação das demais. Os carrascos decidiram, então, jogá-lo ao mar.

O corpo de Vicente foi resgatado por cristãos, que o sepultaram em uma capela perto de Valência. Depois, seus restos mortais foram levados à Abadia de Castes, na França, onde foram registrados milagres. Em seguida, foram levados para Lisboa, na Catedral da Sé, onde estão até hoje. Vicente foi canonizado e recebeu o nome de São Vicente Mártir, hoje santo padroeiro de São Vicente e de Lisboa. Desde então, o dia 22 de janeiro é dedicado a ele.

Por isso, quando a expedição portuguesa comandada por Gaspar de Lemos chegou aqui, em 22 de janeiro de 1502, deu à ilha o nome de São Vicente, pois o local era conhecido, até então, como Ilha de Gohayó. Outro navegador português, Martim Afonso de Sousa, chegou aqui exatamente 30 anos depois, em 22 de janeiro de 1532. Ele foi enviado pela Coroa Portuguesa para constituir aqui a primeira Vila do Brasil e resolveu batizá-la reafirmando o nome do santo daquele dia, São Vicente, pois era reconhecidamente um católico fervoroso.


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segunda-feira, 30 de novembro de 2020

Bandeira de São Vicente SP

 


Segundo a Lei 1684 / 76 - 22 de março de 1976 institui-se oficialmente a Bandeira de São Vicente que assim se descreve: retangular, de cor branca, com um leão rompante de púrpura e bordadura de vermelho carregada de oito cruzes páteas de amarelo

Leão - O leão rompante de púrpura em campo de prata, do Brasão de Armas de Martim Afonso de Sousa, alude ao fundador de São Vicente e Donatário da Capitania. O leão é símbolo heráldico da força, coragem, mando, domínio, grandeza de ânimo, magnanimidade e vigilância, e o púrpuro e a cor da nobreza, grandeza, soberania, gravidade, temperança, devoção, tranqüilidade, abundância, riqueza, dignidade, autoridade e liberdade, lembrando os atributos de administradores e munícipes, que se irmanam em nobre impulso pelo progresso do Município.

Cruzes Páteas - As cruzes páteas afirmam a profunda fé cristã do povo de São Vicente, fé que por São Vicente entrou e se irradiaram no Brasil, pela obra da catequese compreendida pelos padres jesuítas.

segunda-feira, 16 de novembro de 2020

O Turismo de São Vicente é pauta de programa na TV Aparecida

 Partiu São Vicente?
🌊🤩
No programa de hoje o Rodrigo Ruas vai te levar pro litoral de São Paulo, numa cidade que combina passeios históricos com uma paisagem de tirar o fôlego!
💙
Aceita o convite? Te esperamos às 22h na Tv Aparecida!
✈️😉
Com participação especial do Turismólogo Renato Marchesini

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WWW.R9TURISMO.COM



segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Imagens Antigas Viação Cometa: Ônibus de São Paulo para São Vicente SP

 

Foto Antiga Monobloco Mercedes (Viação  Cometa) para São Vicente, partindo da Av. Ipiranga, São Paulo (anos 1960).


Descrições:
Encarroceiradora: Twin Coach
Modelo: PD 4103
Ano: 1948
Chassis/Motor: FACEGOL MOTORS 4X2 Central
Especial: Onibus antigo da COMETA
Sistema: Rodoviario
Empresa: Viação Cometa S.A
Linha:  São Paulo X São Vicente
Veiculo: Real
Placa do Real: Placa Antiga.


Foto do Twin Coach:








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