Revista Le Monde Diplomatique Brasil, do
mês de novembro/2011, traz como tema central a Copa do Mundo é Nossa. E a
capa nos brinda com várias interpretações. Ao olharmos a taça, objeto
de desejo dos maiores times do mundo, está desenhada e coberta por mãos e
notas de dinheiro, demonstrando a lógica dos artigos e a crítica ao
modelo de cidade corporativa que as obras e investimentos estão impondo
as cidades brasileiras.
A primeira vista a capa desta edição temática, já traz em si o que os
artigos, entrevista, pretendem nos oferecer como degustação para este
tema, e como a Copa vem permeando os corações e mentes dos (as)
brasileiros (as). Seja porque é a oportunidade de assistir no Brasil um
evento mundial. Seja porque para alguns é uma possibilidade de ampliar a
renda. Seja porque os investimentos em infraestrutura podem melhorar a
mobilidade urbana nas cidades sedes.
Temos nas reflexões trazidas por essa revista uma visão crítica sobre
as dimensões acima descritas. E para aqueles que estão nas articulações
da sociedade civil, comitês populares da Copa, é um indicativo de que
os investimentos, já nos trazem inquietações sobre os percalços que a
Copa de 2014 vem a oferecer.
Observando o sentido do mundial futebolístico no Brasil, festejado em
2007, é difícil para o senso comum, apresentar uma leitura crítica
sobre os reais impactos que esse megaevento pode trazer para o país. A
Cultura simbólica de que o Brasil é o país do futebol, é uma imagem
afirmativa que tenta aliviar as expressões das desigualdades. Em nosso
país, faz parte do cotidiano viver o futebol, seja nos campinhos dos
bairros, nas ruas da periferia, nas quadras com os futebol society ou na
opção por torcer por um time estadual.
Bem, nada mais significativo para o imaginário do (a) brasileiro (a)
do que a Copa do Mundo de 2014 no Brasil. E neste sentido é importante
deixar claro que não somos contrários a Copa do Mundo. Seria hipocrisia,
porque somos parte deste imaginário cultural. Porém, somos contra ao
modelo de cidade corporativa, estruturado em função dos megaeventos como
a Copa e as Olimpíadas de 2016.
E nesta singela reflexão pretende-se instigar a análise sobre os
riscos, violações que a população pobre está sujeita em função das
grandes obras e na fragilização do modelo de gestão democrática e
garantias constitucionais no campo dos direitos humanos.
Os investimentos em megaeventos como Copa do Mundo e Olimpíadas vêm
demonstrando como a cidade sempre é o “centro das ambições” pelo
movimento do capital. A cidade, mais que nunca, é expressão da sua
mercantilização, onde todos os investimentos caminham para um modelo de
cidade geradora de lucro, nos moldes das grandes empresas.
Nesta concepção sobre a cidade e a gestão do território, todas as
iniciativas buscam favorecer o mercado, e ocorre com a anuência do
Estado. E de que forma isso se concretiza? Na flexibilização da
legislação urbanística; na parceria público-privado; na
desregulamentação dos direitos sociais; na criminalização dos movimentos
sociais e ONGs.
Assim, cria-se no âmbito nas cidades um regime de exceção, como
aponta na revista o Professor Carlos Vainer, e em nome dos grandes
projetos e volumosos investimentos, são definidas as obras que
redesenham o modelo de cidade em nome dos interesses do capital, e de um
planejamento urbano excludente.
Bem, um aspecto importante trazidas nas reflexões do professor Carlos
Vainer, que nos chama atenção no cenário de desenvolvimento das obras
da Copa nos estados é que a realização do “(…) megaevento aprofunda essa
idéia de cidade de exceção: as regras todas vão para o espaço. (…) Por
exemplo, todas as empresas associadas ao Comitê Olímpico Internacional
(COI) e à Federação Internacional de Futebol Associado (FIFA) não pagam
impostos. A lei de responsabilidade fiscal, que estabelece os limites de
endividamento, é flexibilizada para obras associadas a megaeventos”.
(p.04).
Neste modelo não cabe a dimensão da gestão democrática e
participativa. Não é interesse do Estado, e muito menos do capital, que
as intervenções urbanísticas e no uso do solo urbano, seja palco de
debates nos canais institucionais de participação, como os conselhos de
políticas públicas, como o das cidades. Portanto, não é a toa que os
comitês locais populares da Copa tem dificuldades de acesso as
informações reais sobre as obras e parcerias estabelecidas entre público
e privado, lembrando que promovido com os recursos públicos (cerca de
60% dos investimentos das obras é com dinheiro público).
Estas questões nos preocupam porque significa a redução dos
investimentos em políticas sociais. Outro dado é que a afirmação deste
modelo de cidades só acentua as desigualdades e as agrega aos
investimentos nas cidades da Copa a questão do turismo. Então, não é de
se achar estranho que das doze cidades, sete são consideradas de grande
potencial turísticos, onde destas quatro estão no Nordeste.
Ampliando o olhar sobre os impactos sociais e urbanísticos, as
intervenções em razão da construção das arenas da Copa e no
reordenamento urbano no entorno das cidades, estima-se que cerca de 170
mil pessoas serão removidas no país e isto significa a violação do
direito à moradia e ao acesso a terra, demonstrando que a Cidade para a
Copa estão realizando um processo de higienização, removendo os pobres
das cidades.
Nos países onde ocorreram megaeventos semelhantes, como China
(Pequim) e África do Sul, as intervenções urbanísticas buscaram eliminar
a pobreza do entorno dos estádios e a tendência com essas experiências é
que a população pobre foi banida da vivência e convivência nos centros
urbanos. E a sociedade civil organizada em redes e fóruns, cabe
denunciar junto aos órgãos públicos as inúmeras violações e buscar as
medidas jurídicas para assegurar a prevalência do direito em detrimento
da fragilização dos direitos à cidade.
Ainda neste campo, contamos com uma mídia conservadora que veicula em
horário nobre uma forma de monitoramento e andamento das obras nos
Estados e fragilizam os canais legais que são de responsáveis pela
formulação e monitoramento das políticas públicas urbanas. As
informações veiculadas são superficiais e estão preocupadas com o
percentual das obras executadas e se no prazo previsto pela FIFA serão
ou não concluídas. Não estão preocupadas com o impacto e alimentam a
ilusão de que o acesso a arena por ocasião dos jogos será para todos e
todas. Estima-se que pelo valor dos ingressos, poucos de nós terão
condições reais, objetivas, para assistir a um jogo da Copa do Mundo.
Assim, como as obras vem acontecendo, há dúvidas quanto ao seu legado
após 2014. E se algo é veiculado como tão bom para o país, porque vem
gerando desmandos na flexibilização das legislações; violências em razão
dos conflitos fundiários, violações no campo do Direito à Moradia.
Desculpem os otimistas, mas com todas as questões acima elencadas o
legado da Copa pode ser o “ouro do tolo”, porque se de fato acreditamos
que nós cidadãos e cidadãs comuns vamos desfrutar da festa, acho que já
estamos sendo barrados antes de começar. É só olhar as regras da FIFA,
os critérios e regulamentos para o comercio de alimentação e bebidas no
entorno das arenas, as sanções pelo uso indevido da marca – logo.
Se há um aspecto positivo nesta história é a nossa capacidade de
organização e critica a partir da ação política. Somos produtos de nosso
tempo, e neste tempo onde o pensamento hegemônico transforma nossas
cidades como cidade-mercado, precisamos pensar na cidade do possível, da
igualdade e justiça social, para as presentes e futuras gerações,
reafirmando o princípio do Direito à Cidade.
Texto: Mércia Alves – Assistente Social –
Coordenadora do Programa Direito à Cidade – CENDHEC/Integrante da rede
do Fórum de Reforma Urbana – Estadual, Regional e Nacional.
Fonte..:: Portal Popular da Copa
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